Nos últimos dias fiz a leitura duas entrevistas de dois
intelectuais de respeito, Ciro Gomes e Maria Luiza Franco Busse.
As duas leituras me fazem pensar o argumento de Deleuze,
que esquerda não é um posicionamento de governo, mas um modo de vida. Um
governo, em maior ou menor medida é um governo a favor do capital, portanto não
há governo de esquerda. O que vimos nos 14 anos de PT foi um governo a serviço
do capital com uma agenda social. A agenda que não encontro no governo
neopentecostal do PSL. Aqui tomo a ideia de Maria Luiza, o que há são enterros
das políticas afirmativas e a transformação do espaço público em privado. A
destruição tem um campo específico que começa pelo domínio de um tipo de
discurso. Enquanto ele é carregado de ódio de um racismo indiscriminado, o
discurso omite intenções do mercado neoliberal. Vide por exemplo, o incomodo
dos bolsonaristas com políticas de gênero. Ao discutir tais questões observamos
o triunfo do moralismo assexuado e da idolatria da alma como o verdadeiro e
único lugar dos valores culturais, princípios que são o ingrediente e o eterno
fermento do nazifascismo. Um ódio que toma conta de escolhas, opções,
posicionamentos, orientações, enfim, um ódio contra liberdades individuais. Uma
necessidade biopolítica. Não se faz nação com controle sobre os corpos!
Na lógica dos discursos, encontramos um forte que é o
discurso da corrupção. “Desde Cabral, aqui todo mundo rouba”. Mas não há um
olhar para própria corrupção e pelas primeiras crises que o próprio partido tem
– além da crise de identidade, de PSL por Partido do Bolsonaro. Anterior a
isto, o discurso da corrupção do outro. O discurso da corrupção do PT foi
apenas uma válvula de escape para criação de um mito (mito no sentido de
alegoria, fantasia). A existência de um herói é precedida pela figura de um vilão.
A direita pra introduzir uma agenda de mudanças necessitou destruir a figura da
esperança. Criou, nos esquemas históricos, um mostro maior que é, alimentou um
povo e agora repete os mesmos erros, mas continua a vociferar com a corrupção
de outrem. Alimenta o mostro para se por como salvador, como messias.
Mas este movimento discursivo não é exclusivo da
ultradireita brasileira. Na primeira década do século, vivenciamos um movimento
de descolonização na América Latina. Lugo, Kichner, Mijuca, Lula, Evo Morales,
entro outros, propuseram pensar a Latinidade da América. A onda conservadora
assola a América Latina na década seguinte, numa guinada de manutenção do
colonialismo de exploração do capital que não aceita pobre em restaurante, em
aviões, em praças... Nada de novo debaixo do céu. Como se fosse impossível pensar
a América Latina na ótica do pobre, na ótica dos negros, dos povos originários,
da mulher, dos gays, das lésbicas, das bichas... Uma guinada para a direta,
mostra um conservadorismo elitista colonizador que não abre espaço para o
devir.
Diante deste discurso, toma força, aqui no Brasil um que
passa despercebido pela maioria dos “especialistas” de mídia e críticos de
mídias sociais. O discurso do estado mínimo. Foi neste discurso que o Partino
Novo fez uma campanha expressiva onde o foco é 2022. Mas, como pensar um estado
mínimo quando as necessidades primárias, como saúde, educação, violência,
saneamento básico, alimentação, emprego estão distantes? Tão distantes como
estiveram no discurso de pose de Bolsonaro, em nenhum momento citou necessidades
com emprego e eliminação da pobreza. No momento que o governo cria um demônio
ideológico, ele deixa destampado a ideologia do estado mínimo, perversa por
limar a dignidade humana dos pobres e de todos os devires-gente. Como diz Maria
Luiza, “a direita opera como mercadoria, a esquerda trabalha com o sentido de
ser humano.
Texto escrito em 2018
Prof. Dr. Albio Fabian Melchioretto
https://orcid.org/0000-0001-8631-5270
Comentários
Postar um comentário