Beatriz se envolve com o enredo do livro. Ao descobrir o
teor sexual e a sexualidade que acontece nas páginas, ela visa vivenciar elementos que permitam Marcelo escrever, mas ao longo dos fatos, Beatriz, na
busca de si pelo prazer, perde-se. As falas, soltas, faz pensar. Logo nos
primeiros minutos, entre uma cena e outra, Beatriz desvela, “o amor é sexo
domesticado”. O que dá o tom de como o filme trata do tema do sexo, sem pudor e
longe de determinados tabus. A angústia é de Marcelo, para Beatriz, que passa o
filme contestando esta frase, vive para assumir na última cena…
Por três vezes (ou será mais?) ao fundo da cena aparece a
Ponte Vasco da Gama, uma das maiores do mundo. Que ponte Marcelo cogita construir com seu livro? A exploração da angústia, o transformar o livro e
outras mídias parece não ter um fim de ponte, apenas em si. Talvez, seja
essa a ideia de sexo de Marcelo, um prazer em si, mas não para Beatriz. O
prazer é a busca de si, mas não para si, está para além. Ela busca o gozo em si
para inspirar Marcelo. A cena mais forte de prazer, talvez, é quando Beatriz
encontra uma garota de programa e esta toca sua perna. Uma fotografia
fantástica.
Muitas vezes, a trilha sonora foi substituída pelo barulho
do cotidiano. Som do navio, do bonde, das ruas, do entorno, de tudo o que
acompanha a vida. Um romance, por norma, é marcado por canções de amor. Mas
em Beatriz, o barulho me fez lembrar de Nelson Rodrigues, mostrando, não a elegância do encontro a dois, mas os perigos do desencontro. A trilha sonora da
vida tem o barulho urbano, o grito do vizinho, as coisas que desafinam e
desatinam a busca de cada um.
“A palavra regula”, uma das frases mais paradoxais do
filme. A palavra deveria ser o intermezzo para novas conexões. Ela deveria
desregular Marcelo, mas preso na improdutividade — não só do que está
escrevendo, mas de sua trajetória literária. Ele cria textos, mas se mostra
insatisfeito com tudo. Talvez, porque transou apenas com a esposa, e não fez
amor com as palavras. Sentiu-se por elas, regulado… Rubem Alves, lembra que
devemos nos lambuzar com as palavras.
E para terminar este devaneio, me pergunto, qual o sentido
do carro no filme? No início Beatriz e Marcelo namoram dentro dele… em alguns
momentos ele é chamado para salvar Beatriz do escárnio de suas experiências. E
no fim do filme, ele é momento de expurgo. O carro seria a metáfora da vida?
Das fases, da paixão, ao tesão para a libertação? Como se não houve libertação
diante da paixão e do tesão? O carro, de dentro da fantasia, o ponto de
realidade?
Filme comentado
Beatriz (2015), Brasil e Portugal. 103 minutos.
Direção de Alberto Graça com Marjorie Estiano e Sérgio Guizé no elenco.
Prof.
Dr. Albio Fabian Melchioretto
https://orcid.org/0000-0001-8631-527
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