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BEATRIZ UM FILME

 Um drama romântico. O filme é datado de 2015, mas só tive a oportunidade de vê-lo nesta semana. A sequência das ações o deixou um pouco cansativo. Vai e vem e parece não desenvolver a histórica. O filme trata da angústia existencial de um casal, Marcelo, um jovem escritor/jornalista em crise durante a produção de seu mais novo livro, e Beatriz, advogada, que larga sua carreira no Rio para acompanhar o marido em Lisboa. Ela vive paixões e experiência sexuais que desafiam a moralidade. O demorar do desenvolver da história nos faz buscar analogias e forçar interpretações com tudo o que compõe a tela. A angústia de Marcelo é transportada para o espectador.

Beatriz se envolve com o enredo do livro. Ao descobrir o teor sexual e a sexualidade que acontece nas páginas, ela visa vivenciar elementos que permitam Marcelo escrever, mas ao longo dos fatos, Beatriz, na busca de si pelo prazer, perde-se. As falas, soltas, faz pensar. Logo nos primeiros minutos, entre uma cena e outra, Beatriz desvela, “o amor é sexo domesticado”. O que dá o tom de como o filme trata do tema do sexo, sem pudor e longe de determinados tabus. A angústia é de Marcelo, para Beatriz, que passa o filme contestando esta frase, vive para assumir na última cena…

Por três vezes (ou será mais?) ao fundo da cena aparece a Ponte Vasco da Gama, uma das maiores do mundo. Que ponte Marcelo cogita construir com seu livro? A exploração da angústia, o transformar o livro e outras mídias parece não ter um fim de ponte, apenas em si. Talvez, seja essa a ideia de sexo de Marcelo, um prazer em si, mas não para Beatriz. O prazer é a busca de si, mas não para si, está para além. Ela busca o gozo em si para inspirar Marcelo. A cena mais forte de prazer, talvez, é quando Beatriz encontra uma garota de programa e esta toca sua perna. Uma fotografia fantástica.

Muitas vezes, a trilha sonora foi substituída pelo barulho do cotidiano. Som do navio, do bonde, das ruas, do entorno, de tudo o que acompanha a vida. Um romance, por norma, é marcado por canções de amor. Mas em Beatriz, o barulho me fez lembrar de Nelson Rodrigues, mostrando, não a elegância do encontro a dois, mas os perigos do desencontro. A trilha sonora da vida tem o barulho urbano, o grito do vizinho, as coisas que desafinam e desatinam a busca de cada um.

“A palavra regula”, uma das frases mais paradoxais do filme. A palavra deveria ser o intermezzo para novas conexões. Ela deveria desregular Marcelo, mas preso na improdutividade — não só do que está escrevendo, mas de sua trajetória literária. Ele cria textos, mas se mostra insatisfeito com tudo. Talvez, porque transou apenas com a esposa, e não fez amor com as palavras. Sentiu-se por elas, regulado… Rubem Alves, lembra que devemos nos lambuzar com as palavras.

E para terminar este devaneio, me pergunto, qual o sentido do carro no filme? No início Beatriz e Marcelo namoram dentro dele… em alguns momentos ele é chamado para salvar Beatriz do escárnio de suas experiências. E no fim do filme, ele é momento de expurgo. O carro seria a metáfora da vida? Das fases, da paixão, ao tesão para a libertação? Como se não houve libertação diante da paixão e do tesão? O carro, de dentro da fantasia, o ponto de realidade?

Filme comentado

Beatriz (2015), Brasil e Portugal. 103 minutos. Direção de Alberto Graça com Marjorie Estiano e Sérgio Guizé no elenco.



Prof. Dr. Albio Fabian Melchioretto
https://orcid.org/0000-0001-8631-527

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