Pular para o conteúdo principal

EDUCAÇÃO CIENTÍFICA COMO ALICERCE PARA UMA APRENDIZAGEM EMANCIPATÓRIA

Imagem gerada por I.A., tendo este texto
como "prompt".



Este texto nasce a partir de uma conferência apresentada pelo Prof. Dr.  Pedro Demo, durante a X FEBIC, em Joinville, no dia 09 de setembro de 2025. Ela teve como título, “Educação Científica - Direito de todos”. E das provocações apresentadas surgem alguns rabiscos.

E o primeiro deles é questionar o lugar da ciência na escola? Parece que falar de ciência na escola é uma conversa secundária, diante de tatos afazeres aplicados a ela. Diante disto, a educação científica, conforme propõe Pedro Demo, transcende a simples transmissão de conteúdo para se afirmar como um pilar para a formação de cidadãos autônomos. Sua defesa incisiva posiciona a ciência não como um corpo fechado de verdades, mas como uma prática crítica e dialógica, essencial para a desconstrução da realidade e dos discursos que a permeiam, como uma condição de enfrentamento as falsidades produzidas por ondas de fake-news e pós-verdades.

No entanto, Demo alerta para um cenário preocupante: a ciência ainda é uma disciplina marginalizada nos currículos, desde a educação básica até a formação docente, perpetuando um modelo de ensino reprodutivo que ignora a capacidade de autoria do estudante. Ainda se pensa a ciência marginalmente, como algo a parte às condições da escola. Por exemplo, os discursos de inserção ao mundo do trabalho e rapidez de resposta, reduzindo o tempo do estudante da escola, para que ele logo esteja apto ao mercado, reduz o olhar a ciência como possibilidade. Pensar a escola somente para o mundo do trabalho é o um grande equívoco.

Em primeiro plano, Demo estabelece a educação científica como um processo de emancipação, no qual o estudante é convidado a ser autor de seu próprio conhecimento, recuperando uma ideia de Paulo Freire (2004). A ciência, em sua visão, não deve ser apresentada como uma verdade dogmática, mas como uma atividade ambígua, ética e intrinsecamente autocrítica, cujo valor reside na "força do melhor argumento", numa referência ao pensamento habermasiano (Habermas, 2023). Esse princípio pode e deve ser cultivado desde os primeiros tempos na escola, pois a criança, naturalmente curiosa e indagadora, consegue lançar hipóteses, experimentar e argumentar. Uma "escola à altura da criança" é, portanto, aquela que valoriza sua autoria e criando ambientes onde a elaboração própria e o ludismo são ferramentas centrais para a construção do saber.

Contudo, essa concepção esbarra numa realidade educacional que Demo classifica como "pré-científica". A ciência está praticamente ausente em avaliações nacionais como o Ideb, é tratada reduzidamente na Base Nacional Comum Curricular (MEC, 2018) e não compõe o cerne da formação de professores. O resultado é um sistema que privilegia o ensino em detrimento da aprendizagem, onde o conhecimento é meramente reproduzido e a autoria do estudante é negligenciada. Essa lacuna não é somente pedagógica, mas também social, por gerar e perpetuar o analfabetismo científico, a exclusão digital e o analfabetismo funcional, privando parcelas significativas da população do direito à mobilidade social e ao usufruto dos avanços tecnológicos.

Por fim, as considerações de Demo apontam para a urgência de uma reavaliação do propósito da escola. "Avaliar para cuidar" significa utilizar dados não como vereditos finais, mas como indicadores para um acompanhamento mais atento do desenvolvimento do estudante. A transformação almejada, no entanto, é impossível sem o professor. É imperativo cuidar do educador, formando um profissional que seja ele próprio um autor, um cientista e um pesquisador em sua prática, capaz de mediar uma aprendizagem significativa. Só assim, com um professor devidamente preparado e valorizado, poderemos cultivar o "estudante autor" e fazer da educação científica, de fato, um direito de todos, concretizando uma escola verdadeiramente inclusiva e democrática.

Textos citados

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 30. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

HABERMAS, Jürgen. Teoria da ação comunicativa - 2 volumes: racionalidade da ação e racionalização social | Para a crítica da razão funcionalista. São Paulo: Editora UNESP, 2023.

MEC, Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. 3. ed. Brasília: MEC, 2018. (Texto Preliminar). 

Textos de Pedro Demo

DEMO, Pedro. Pesquisa: princípio científico e educativo. 12. Ed. São Paulo: Cortez, 
2006.
DEMO, Pedro. Aprender como autor. São Paulo: Atlas, 2015.


Texto escrito por Prof. Dr. Albio Fabian Melchioretto
Filósofo e geógrafo. Doutor em Desenvolvimento Regional. 
Editor do Tecendo Ideias (Top 100 Education Podcasts)


COMO CITAR:
MELCHIORETTO, Albio Fabian. Educação científica como alicerce para uma aprendizagem emancipatória. Blog do Professor, 2025. Disponível em: https://albiomelchioretto.blogspot.com/2025/10/educacao-cientifica-como-alicerce-para.html. Acesso em: 7 out. 2025. 

Comentários